No vídeo, feito no formato de entrevista, S.O., de 63 anos, relata ter sido xingado pelo então administrador do Lar dos Idosos, Antônio Carlos Nunes Paraíso. “Chegou me agredindo, me ameaçou, me humilhou, no meio de todo mundo, lá no salão. Falou, pra mim, pra eu ver o tamanho dele e o meu. Eu sou um deficiente numa cadeira de rodas”, relata o idoso em um trecho do vídeo. Em outro trecho, uma voz de mulher pergunta ao idoso do que ele foi chamado. S.O responde: “...cagão, merda, um pau de merda”.
A mesma mulher pergunta se é verdade que o administrador da instituição teria mandando o idoso comer lavagem. Ele confirma. “...mandou eu comer lavagem...mandou eu levantar da cadeira... me agredindo à toa, sem eu saber de nada”, diz ele. O vídeo, amplamente divulgado nas redes sociais, gerou inúmeros comentários sobre a situação do asilo e o tratamento dado aos idosos.
Para o promotor, o caso tem que ser melhor investigado. “Vamos dar o direto de defesa, para a gente avaliar com mais serenidade, com adequação, qual é a sanção em que ele supostamente poderia estar incurso. Nós não podemos prejulgar. Eu penso que tem a denúncia e nós temos que dar o direito de defesa. Aí sim, se configurado, evidentemente, haverá uma ação penal relativa a essas agressões verbais”, disse.
Caso comprovada a denuncia, o MP entrará com uma ação formal. “Nós vamos entrar com uma ação de responsabilização, porque, efetivamente, hoje, vigora o direito ao respeito integral do ser humano e todo insulto, tosa, agressão psicológica feita ao indivíduo e, principalmente, ao idoso tem um agravamento maior, uma repercussão. Nós não podemos admitir uma coisa dessa natureza”, declarou.
Demissão
Ontem pela manhã, antes mesmo da fiscalização encabeçada pelo MP, Antônio Carlos Paraíso pediu demissão do cargo. Ele disse que a decisão foi para preservar sua família e também o Lar dos Idosos, que sobrevive, em grande parte, com doações. “Esse vídeo deu uma série de transtornos para a minha família. Muitas daquelas pessoas que viram, que comentaram, são doadoras. Fiquei apreensivo que isso comprometesse o Lar. O que foi dito é muito pesado, para a gente estar à frente de uma entidade como essa. Disseram que sou um monstro”, desabafou ele.
Após uma reunião com a administração do Lar dos Idosos de Guaçuí, o promotor de justiça Gino Martins Borges Bastos conversou com o aposentado que teria sido agredido. S.O confirmou ter sido humilhado e xingado pelo administrador da instituição. Segundo ele, isso aconteceu há cerca de três meses. S.O. que atualmente está numa cadeira de rodas, é interno no Lar dos Idosos há cerca de um ano. Ele disse que foi para lá para poder fazer fisioterapia. “Onde eu morava, no assentamento, era muito longe, a passagem era cara, aqui, faço toda semana”, disse ele.
Além de ouvir S.O, a comitiva que fez a fiscalização também conversou com outros idosos e com funcionários do Lar. A maioria se queixou da alimentação e de não ter dinheiro. É que o Lar dos Idosos, que recebe a aposentadoria dos internos, tem a obrigação legal de repassar, a eles, 30% dos vencimentos, o que não vem sendo feito.
Segundo Antônio Carlos Paraíso, o Lar dos Idosos já fecha todos os meses no vermelho. Se o repasse for feito, não haveria dinheiro para manter o local. “Nosso gasto médio, por mês, é de R$ 40 mil a R$ 45 mil, enquanto eu tenho uma receita de R$ 41 mil. Então, se eu pegar os 30% em cima disso, daria R$12 mil hoje. Seria uns R$ 15 mil, pelo menos, de déficit mensal”, explicou. Segundo ele, além das aposentadorias dos idosos, o Lar sobrevive com doações e um repasse de verbas da Setades, feito por meio da Prefeitura, no valor aproximado de R$ 78 mil, que ainda não foi feito. “Entregamos a documentação, está tudo certo, mas não sei porque ainda não saiu”, disse ele.
Pombos
Para a presidente interina do Conselho Municipal do Idoso, Denise Maria Azevedo Pereira, queixas contra o Lar dos Idosos não são novidade. A maioria delas é por causa da precariedade na alimentação, na higiene do local e no trato dos funcionários com os internos. “Espero que haja uma mudança geral. Uma maior dignidade para os idosos”, declarou. Ela mostrou a situação do pátio interno, onde fezes de pombos podiam ser vistas nas paredes, no chão e também na bancada onde fica o bebedouro que os idosos usam. Sobre isso, o ex-administrador explicou que a situação já foi pior e que, há alguns meses, o pátio foi telado, para evitar a entrada dos pássaros. “Eles ainda entram quando o portão para o pátio interno fica aberto. Os próprios idosos abrem para ir lá fora pegar sol e alimentam os pombos”, disse.
Em relação às denúncias de alimentos vencidos, Antônio explicou que pode acontecer de alguém chegar e doar alguma coisa nessas condições, mas que isso não é servido aos internos. Sobre a qualidade do material de limpeza usado para lavar a roupa dos idosos, inclusive de cama, o que estaria causando dermatite em alguns deles, o ex-administrador disse que é em função da falta de recursos. “Tem uma hora que tem que optar por alguma coisa. Abrir mão de que? De comida? De fraldas? De remédios?” – desabafou.
Sobre o motivo da gravação do vídeo e da denúncia, o administrador acredita que o motivo pode ser vingança, já que a suposta agressão teria acontecido meses atrás, conforme foi confirmado pelo idoso em questão ao promotor, durante a visita. “Quero crer, não posso afirmar, segundo chegou ao nosso conhecimento, ele (quem divulgou o vídeo) é irmão de uma das meninas que foi demitida e namorado da outra”, falou.
Na semana passada, antes do vídeo ser postado nas redes sociais, duas técnicas de enfermagem, ex-funcionárias do Lar dos Idosos, demitidas no último mês, estiveram na delegacia denunciando maus tratos no local. A Polícia Civil, assim como o Ministério Público, está investigando o caso.
Aqui Notícias/Fotos: Lucia Bonino