‘Cidades polo’ no interior do estado do Rio têm registrado nos últimos dias os maiores números de mortes por covid-19 da média móvel verificados até agora. O movimento contrasta com a capital fluminense —que teve pico de óbitos há dois meses e agora vê redução das mortes desde 20 de junho— e indica confirmação de tendência de interiorização do coronavírus. Especialistas ouvidos pelo UOL preveem aumento de óbitos em regiões do interior do Rio. Para eles, a estrutura geográfica dessas áreas, onde há menor acesso ao atendimento médico e grande circulação de pessoas em cidades vizinhas, contribui para o cenário. Dos 92 municípios do estado, apenas quatro ainda não registraram mortes.No mês passado, ainda havia 18 cidades sem óbitos por covid-19.
Ontem, o estado contabilizou 12.535 óbitos —63% deles na capital. Mas a tendência, de acordo com os especialistas, é que essa proporção diminua com a interiorização da doença. A média móvel diária, calculada com base nos óbitos registrados em uma semana, é o indicador mais adequado para observar a tendência da epidemia, por equilibrar as variações abruptas dos números ao longo da semana. Lockdown no interior do RJ.
Campos dos Goytacazes, maior município do Norte Fluminense, onde moram mais de 500 mil pessoas, teve sua maior média móvel diária de mortes em 14 de julho, com cinco óbitos —o dobro em comparação à semana anterior. Para se ter ideia, em 19 de maio, quando a pandemia se aproximava do pico na cidade do Rio, Campos registrava média de uma morte diária. O município atingiu o pico de casos em 25 de junho, quando foi contabilizada média móvel diária de 55 novos infectados. As cidades menores no entorno de Campos têm agora o maior volume de registros de coronavírus. É o caso de São Fidélis, município com 37 mil moradores, que só registrou a primeira morte por covid-19 em 11 de julho. Até agora foram nove óbitos confirmados, e a prefeitura recuou no processo de reabertura e decretou lockdown —bloqueio total na cidade.
Vírus se espalha por cidades vizinhas Segundo especialistas, a tendência é de que inicialmente ocorra alta de infectados e, em seguida, aumente o número de mortes. Ainda de acordo com pesquisadores, os pacientes passam a buscar por atendimento nas ‘cidades polo’ do interior ou até mesmo na capital, com chances de voltar a sobrecarregar o sistema de saúde e de aumentar a circulação do vírus entre os municípios. A situação deve se agravar. Quem está em uma cidade pequena, não tem tantas opções e deve buscar atendimento nas cidades maiores. Mas os recursos de saúde estão sendo desmobilizados. Será que estamos preparados para isso? Diego Ricardo Xavier, epidemiologista da Fiocruz Os aumentos de mortes nas cidades maiores não devem ser encarados como casos isolados, uma vez que o vírus passa a circular rapidamente entre as vizinhas, de menor porte. “São municípios que não têm estrutura grande. A doença se espalha rápido por onde as pessoas costumam circular. Enquanto os índices ainda estão caindo na capital, cidades grandes do interior passaram a registrar a pior média de mortes desde o começo da pandemia”, argumenta. “O problema no enfrentamento à pandemia é que essas cidades estão sendo tratadas como se fossem isoladas. Não é bem assim”, complementa.
Essas cidades não têm leitos suficientes. E, com aumento dos casos, os pacientes vão precisar ir para cidades maiores. Isso indica que a situação deve se agravar nas próximas semanas. Hoje, a cidade do Rio é responsável por 63% dos óbitos. A tendência é que esse percentual diminua consideravelmente nos próximos dias Domingos Alves, professor de Medicina da USP e integrante do Covid-19 Brasil.
Mortes por covid-19 sobem a serra Com mais de 300 mil habitantes, Petrópolis, na região serrana, atingiu o maior índice de óbitos verificado até agora da média móvel no dia 16 de julho, quando passou a contabilizar três mortes por dia. O pico de casos ocorreu um mês antes —no dia 13 de junho, quando foram registrados 28 infectados por dia.
O maior índice de pessoas com a doença em Teresópolis, município vizinho e de menor porte, chegou a 52 casos por dia na última terça-feira (21), número quatro vezes maior em comparação ao dia anterior. Em Nova Friburgo, também na região serrana, o pico foi registrado na segunda (20). Somadas, as três cidades contabilizam 261 mortes e 3.916 casos. O pneumologista José Henrique Castrioto de Cunto, professor de Infectologia na Faculdade de Medicina de Petrópolis, atribui os números de óbitos no município da região serrana à elevada faixa etária da população. Segundo ele, foi feita uma barreira sanitária eficiente na região. Entretanto, ele ainda prevê um período maior de convívio com com o vírus. “Houve aqui um achatamento da curva. O problema é que a situação ainda vai se arrastar por mais tempo em Petrópolis”, projeta.
Tratamento precoce em Volta Redonda Em Volta Redonda, no sul fluminense, a maior média móvel de casos de covid-19 foi registrada na terça-feira (21), com 102 novos infectados —número seis vezes maior em comparação ao dia 18, com média de 16 registros diários. Há duas semanas, a prefeitura firmou um convênio com professores, médicos e profissionais de saúde da UFRJ (Universidade Federal do Rio), que passou a atuar no sistema de saúde local para minimizar o impacto da doença no município, que já contabiliza mais de cem óbitos e cerca de 3.000 casos.
O infectologista Edimilson Migowski, profissional da UFRJ que integra o convênio, diz que a estratégia adequada em meio a esse cenário é o tratamento precoce de pacientes com covid-19. “É preocupante, porque o interior não tem a mesma estrutura da capital em termos de atendimento hospitalar especializado. O município não tem dinheiro para bancar terapia intensiva. A melhor alternativa é fazer o tratamento precoce, com o protocolo próprio da cidade”, diz. Cerca de 40 pacientes de alto risco estão fazendo tratamento precoce dentro de casa no município, sem registros de internações ou óbitos.
Herculano Barreto Filho
Do UOL, no Rio
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