A Lei Áurea assinada em 13 de maio de 1888 aboliu de vez a escravidão no Brasil, 16 anos depois nascia Maria Miranda de Assis. A certidão de nascimento da idosa confirma a data de aniversário: 17 de fevereiro de 1904. Conhecida como Dona Maria, completou essa semana 111 anos. Moradora de São José do Calçado, na Região do Caparaó, ela e Bob, seu cão de estimação ‘diferente’, de três patas, mostram que as pessoas podem alcançar à felicidade driblando as ‘cruzes’ pesadas da vida.
A despeito das dificuldades, a fé de Dona Maria lhe mantêm de pé e não a deixa fraquejar. Filha de Francisco Tomas de Assis e Antônia Pereira de Azevedo, a anciã relata que seus pais nasceram em Minas Gerais e não crê que nenhum de seus 20 irmãos esteja vivo, acrescentando ainda que toda sua infância foi na roça e nada alegre, pegando parte de um tempo da escravidão.
Ela passou parte de sua vida dedicando-se às atividades do campo, o trabalho de preparo de terra, plantio e colheita de grãos, presenciando desde os 15 anos a transição de 28 presidentes no Brasil.“Nasci em Cachoeirinha de Rio Pardo. Em 1943, pelo decreto lei estadual nº 15177, de 31 de dezembro daquele ano, Cachoeirinha de Rio Pardo passou a ser chamado “Irupi”, nome de origem indígena que significa “amigo belo” e “águas tranquilas pequenas”, elevado à categoria de município com a denominação de Irupi, pela lei estadual nº 4520, de 16 de janeiro de 1991”, resgatou um pouco da história.
Dona Maria se casou apenas uma vez, em Cachoeirinha de Rio Pardo, aos 21 anos. Depois do casamento, mudou-se para São José do Calçado, que na época só tinha capoeirão e uma pequena fila de casas. E do fruto do casamento com Cândido Rangel Miranda, que faleceu em 15 de setembro de 1991, aos 83 anos, nasceram 12 filhos biológicos, mas somente cinco estão vivos, perdendo a conta de tantos netos e bisnetos.
Ela explica que durante esses 111 anos, o dia mais feliz de sua vida foi o nascimento de seu primeiro filho. A morte de sete de seus 12 filhos e seu esposo são fatos que o tempo não deletou de sua memória. Portadora de diabetes mellitus, bronquite e pressão arterial, apanha garrafas pet, e vende para complementar sua renda, de cerca R$ 400,00.
“Sobrevivo com a aposentadoria do meu esposo, que morreu há 24 anos, sou analfabeta e conhecedora da Bíblia Sagrada. Busco a Deus, ouço música gospel, cato produtos recicláveis, percorro as ruas atrás de papelão, latinhas e garrafas pet, vendo produtos de beleza, roupas e limpo galinha caipira. Ainda arrumo a casa e cuido de meus cães, entre eles o Bob, que tem três patas, meu cãozinho que considero um tataraneto”, brinca.
Juventude longa
A anciã frisa que ficou apenas uma vez internada em um hospital, isso, depois de 100 anos. “Cozinho com gordura de porco e óleo de soja. Como bastante verdura e bananas. Não gosto muito de carne, a não ser carne de porco. Permaneço de pé. A vida é uma peleja constante em um navio em alto mar, onde a tempestade testa nossa fé”, pondera.
Baque total
Em cinco de maio de 2011, Dona Maria sofreu um grande baque. O desejo de receber e ler um exemplar dos jornais Aqui Notícias e Folha do Caparaó que traziam o especial ‘Dona Maria e Bob: Dois exemplos de superação’ não se concluiu para um dos seis filhos. Na época, numa quinta-feira, por volta das 6 horas, Cândido de Assis Rangel, 54 anos, após se sentir mal em sua residência, em São José do Calçado, morreu vítima de Infarto.
Na véspera do falecimento de Cândido, por ventura, o mesmo pediu a um repórter do Jornal Folha do Caparaó que guardasse para ele um exemplar da edição que trazia uma homenagem à mãe dele de 107 anos (naquela época) e o cão Bob, dizendo que estava ansioso para ver o jornal. Porém, horas depois seu pedido foi interrompido pelo sinistro.
AQUIES/Sérgio Oliveira