Vítima do crime de exposição pública de intimidade sexual, padre Alfredo virou réu perante a Igreja Católica. Foi suspenso de suas atividades e está enclausurado e incomunicável na sede da Diocese de Campos. Em Miracema, sua cidade natal, no entanto, o povo se divide entre o perdão, a penitência e a idolatria. Por lá, não se fala em Lava-Jato, Dilma ou Fla-Flu. Só se fala no padre.
“É amigo de frequentar minha casa. A comunidade toda está sem entender. É muito azar. Dele e meu, que queria mostrar minha cidade como primeira colocada do estado no ranking do Ideb (índice que mede a qualidade da educação pública) e agora tenho que falar sobre o padre nu e um ator da novela ‘Babilônia’ que anda pelado e diz ser de Miracema. Eu não mereço!”, brincou sem jeito Juedyr Orsay, o prefeito, ao tratar do tema.
Já na delegacia (137ªDP), ninguém falou abertamente sobre a saia justa. O delegado informou apenas que não houve registro de ocorrência e pediu para não comentar o assunto que está em todas as rodas na cidade.
“A maioria tem vergonha de falar, mas a verdade é que a igreja ficaria lotada se ele voltasse. A foto fez um sucesso danado”, brincou o garçom do Snob’s, um dos poucos restaurante da cidade.
INTIMIDAÇÃO
Na Praça da Matriz, em frente à igreja, o clima é tenso. Alguns fiéis tentaram intimidar a equipe do DIA. O secretário da paróquia, Jarío, informou que monsenhor Mateus, responsável pela igreja, não daria entrevistas e pediu que a equipe se retirasse.
“Acho que o grande erro dele foi não ter falado a verdade, pois pecar, todos pecamos. Padre Alfredo é uma pessoa de bem e um líder local. Se tivesse contado a história em vez de fugir, ficaria melhor para ele. Seria mais correto com todos os fiéis”, disse Sílvia Helena.
Em meio a tanto bafafá, está a humilde família de padre Alfredo, que mora numa casa simples no bairro da Rodagem. Assustados e preocupados com possíveis punições ao filho, dona Malvina, seu Geraldo Borges e os oito filhos relutaram em dar entrevista e tirar fotos.
“Se foi erro dele, o que acho que não foi, quem nunca errou nessa vida? Sei que meu filho não é disso. Ele nunca teve namorada. Quem está inventando história vai ter que pagar”, disse dona Malvina.
Um dos irmãos do padre Alfredo disse ter conseguido falar com ele rapidamente por telefone, em Campos. E que o religioso teria dito ter sido vítima de um golpe.
“Ele disse que vai explicar o que aconteceu e que as pessoas que o injuriaram serão punidas”, disse o irmão.
PAU QUE BROTA
Religioso nasceu no Paraíso, ao lado da igreja do Imediato Consolo
A história do padre Alfredo é daquelas que têm tudo para virar lenda urbana. Se bobear, novela. Ou crônica ao melhor estilo de Nelson Rodrigues. A começar pelo nome da cidade.
Miracema significa ‘pau que brota’ em tupi-guarani, e ganhou esse nome porque a primeira estaca fincada na região brotou. E era justamente a da construção da Igreja Matriz, em torno da qual o vilarejo se desenvolveu.
Além disso, a localidade onde o religioso nasceu se chama Paraíso. Vizinho à humilde casa onde foi criado há também um santuário religioso, chamado Nossa Senhora do Imediato Consolo.
Nas ruas da cidade, todos têm o roteiro pronto, decorado e na ponta da língua. Na própria Igreja, é possível saber a versão popular da história.
O que se conta é que o reliogioso foi vítima de uma mulher chamada Mônica. Eles teriam se conhecido em Goiás, terra natal da moça, mãe solteira que vivia em desgraça dentro da família. Expulsa de casa, foi acolhida pelo padre, que a teria levado para Campos e, em seguida, a Miracema.
Ex-funcionária de um tradicional mercado da cidade, Mônica já era conhecida à boca pequena como ‘a mulher do padre’, mas teria sido demitida dias antes de espalhar as fotos de Alfredo nu. Ríspido e desconfiado, o dono do mercado não quis papo com o DIA .
“Nada a declarar”, reagiu.
‘QUEM NÃO ERRA?’
Padrinhos de batismo de Alfredo defendem o afilhado de críticas
Casal dos mais antigos do Paraíso, os comerciantes José e Roza Chacour, de 82 anos, conhecem como poucos a história do autor da selfie comprometedora, afinal, são padrinhos de batismo do filho mais famoso de Miracema na atualidade.
“Sempre foi uma pessoa muito boa, dava sermões muito inteligentes e vivia a fazer o bem onde quer que fosse. Acho que ele errou, e errou feio. Mas quem não erra?” relativizou Roza Chacour.
José, no entanto, se diverte com a história. Inteligente e superdebochado, o filho de libaneses critica o conservadorismo da Igreja e sai em defesa do padre.
“Tem mais é que ser feliz mesmo. Vai guardar para quem? Estava com uma mulher adulta. Não pode fazer isso é com criança. Esse negócio de pedofilia não é coisa de Deus. Mas ser feliz, é. Deixem o Alfredo ser feliz. Não é o único padre que faz isso”, defendeu José Chacour.
O comerciante lembra da infância difícil de Alfredo, filho de uma família que trabalha em regime de semi-escravidão num latifúndio local.
“Filho de preto e de pobre não podia estudar, só trabalhar. Tenho muito orgulho de ter ajudado o Alfredo e toda a família dele. São pessoas de bem”, atestou Chacour
O Dia/Caio Barbosa