O Projeto de Lei 4.211/12 que regulamenta a atividade dos profissionais do sexo, de autoria do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), está parado na Câmara dos Deputados, aguardando a composição de uma comissão temporária para analisá-lo.
O projeto foi batizado de Lei Gabriela Leite em homenagem à escritora, presidente da organização não governamental (ONG) Davida e ex-aluna de sociologia da Universidade de São Paulo (USP), que decidiu virar prostituta aos 22 anos. Gabriela foi muito ativa na luta pelos direitos das prostitutas e morreu em 2013.
O tema do projeto de lei é polêmico e não há consenso entre defensores e opositores. O autor, Jean Wyllys, defende que a marginalização das pessoas que lidam com comércio do sexo leva à exploração sexual.
“Aquela prostituta de classe média alta, que divide um apartamento no Rio ou nos Jardins, em São Paulo, talvez seja menos vulnerável que o proletariado da prostituição, que depende das casas e de exploradores sexuais. Eu quero proteger os direitos delas, garantir a dignidade e combater a exploração sexual de crianças e adolescentes. Digo, 'elas', porque a maioria das pessoas que realizam trabalho sexual são do gênero feminino, mas o projeto também beneficia os garotos de programa”, afirmou o deputado.
Há quem discorde dessa posição. Tânia Navarro Swain, feminista e historiadora da Universidade de Brasília se considera “abolicionista”. Ela é contra a legalização da prostituição por acreditar que isso significaria a institucionalização do proxenetismo. Os proxenetas, que são vulgarmente conhecidos como “cafetões”, segundo Tânia, seriam transformados em empresários.
“A prostituição é a maior violência social contra as mulheres. A legalização da prostituição incentiva o tráfico ignóbil, imundo e nojento, que força as mulheres a se prostituírem. É um ato que só favorece os homens e o patriarcado. Mulheres não são mercadorias, são pessoas”, disse a historiadora.
Jean Wyllys, no entanto, afirma que sua intenção não é incentivar a prostituição. “As prostitutas existem, e elas estão prestando esse serviço. E se há um serviço, há demanda. A sociedade que estigmatiza e marginaliza a prostituta é a mesma sociedade que recorre a ela. Na narrativa mais antiga produzida pela humanidade, a prostituição já é citada. Não é à toa que dizem que é a profissão mais antiga do mundo”.
Marcela Azevedo, representante do movimento Mulheres em Luta, diz que o projeto, caso aprovado, vai regulamentar a mercantilização do corpo feminino. “Nós entendemos que a prostituição é colocada para as mulheres como parte do processo de opressão. A perspectiva de melhoras, como direitos trabalhistas e combate à violência, deve ser garantida pelo Estado independentemente da regulamentação da profissão. Qualquer mulher na rua, de dia ou de noite, com qualquer roupa, deve se sentir segura para transitar, e o Estado deve garantir isso”.
Cida Vieira, presidente da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), defende a legalização da profissão e afirma que, como qualquer outro profissional, a prostituta deve ter o direito de se aposentar e receber benefícios.
Desde 2002, a prostituição está no rol das ocupações brasileiras. Reconhecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a atividade dos profissionais do sexo é restrita aos maiores de 18 anos.
Quem foi Gabriela Leite
Gabriela Leite foi uma ativista brasileira que lutou pelos direitos das prostitutas. Nascida em 1951, em São Paulo, Gabriela trocou o curso de sociologia na USP pela prostituição, nos anos 1970.
Na década de 1980, participou da organização do 1º Encontro Nacional de Prostitutas e começou a militar em defesa da regulamentação da profissão. Em 1992, fundou a ONG Davida com objetivo de fortalecer a cidadania das prostitutas por meio da mobilização e organização da categoria.
Em 2002, presenciou a inclusão da ocupação “trabalhador do sexo” na Classificação Brasileira das Ocupações (CBO), o que permitiu que as prostitutas pudessem se registrar no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) como autônomas e ter garantia de aposentadoria.
Em 2005, idealizou a grife Daspu, desenvolvida por prostitutas, e cujo nome era uma provocação à Daslu, loja de artigos de luxo à época. As coleções eram desenvolvidas em parceria com profissionais da moda e atraíram atenção da mídia nacional e internacional.
Em 2010, foi candidata à deputada federal pelo Partido Verde, mas não se elegeu. Suas bandeiras eram o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), a união civil homossexual, o direito ao aborto e a regulamentação da prostituição. Gabriela morreu no Rio de Janeiro, aos 62 anos, vítima de câncer.
EBC