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quinta-feira, 28 de novembro de 2019

ATRIZ CAMPISTA SOFRE EPISÓDIO DE RACISMO E GORDOFOBIA

Atriz fez agradecimento à Corporação logo após gravação
Atriz fez agradecimento à Corporação logo após gravação / Reprodução/Rede Social
Eu sou negra, sou gorda, sou brasileira, sou atriz. Eu conto história, eu conto ficção. Eu não mereço ser agredida, assim como nenhuma pessoa”. Esse relato foi feito no Instagram, pela atriz campista Cacau Protásio, que, após gravar cenas do filme “Juntos e Enrolados”, no Quartel-Central do Corpo de Bombeiros, no Rio de Janeiro, se viu envolvida num episódio de racismo, homofobia e gordofobia. Durante as filmagens, um bombeiro teria gravado um áudio e divulgado pelo WhatsApp, criticando a cena e fazendo insultos, inclusive raciais, à atriz.
No áudio, o homem reclama da cena em que Cacau, vestida com a farda dos Bombeiros, dança com quatro bailarinos no pátio do quartel e dispara insultos: “Vergonhoso, mete aquela gorda, preta, filha da p*** (Palavra impublicável) numa farda de Bombeiro, uma bucha de canhão daquela, com um monte de bailarino viado, quebrando até o chão. Vão achar que é o quê, bombeiro? Aquilo é tudo viado.”
Cacau, que logo após a filmagem chegou a fazer uma postagem agradecendo ao Corpo de Bombeiros pela receptividade, também usou as redes sociais para comentar o episódio lamentável. “O Bombeiro é uma corporação que eu respeito, que eu amo, que eu queria ser quando criança. Nas minhas primeiras entrevistas, eu sempre falei isso”, disse a atriz. Ela também ressaltou que foi muito bem recebida na corporação e disse que printou todos os comentários racistas, mas não informou se vai procurar a Polícia para registrar o fato.
Artista, negra e campista, como Cacau Protásio, a atriz Adriana Medeiros lamentou o episódio vivido pela conterrânea.
— A gente está em uma semana em que teve um procurador, da Justiça do Pará, dizendo que não temos dívidas nenhuma com os quilombolas; que não há navio negreiro aqui. Enfim, todo esse “blá, blá, blá” e “mi, mi, mi” que colocam a nós, negros, na posição de vitimismo. Eu sempre falo que a natureza tem respostas muito sombrias e, às vezes, muito loucas. Aí, na mesma semana, as ossadas dos nossos ancestrais transparecem em Manguinhos; na mesma semana, (o caso da) Cacau Protásio, como tantos outros negros e negras que são linchados diariamente por uma gente esquizofrênica e ignorante, sobretudo quando a gente faz arte — declarou.
Adriana destacou que episódios envolvendo racismo e outras posturas preconceituosas são comuns, mas costumam ser ignorados porque as vítimas, na maioria dos casos, não têm voz e visibilidade:
— Eu acho que a gente está vendo o que se vê, diariamente, há muitos anos: a senzala continua sendo senzala. E a gente fica em uma luta hercúlea para que as pessoas entendam que somos humanos. Não há diferença nenhuma porque todo termina com terra por cima e na horizontal. A diferença é que a Cacau é um sol, e ela vai deixar o trabalho dela como referência para um monte de gente, sobretudo para mim. Eu queria ter um pouco do que ela tem de comicidade, por exemplo. Mas quanto incomoda a um segmento da sociedade ver-nos sair da senzala e estar lá dentro da casa grande fazendo nosso teatro, cantando nossas canções, usando as roupas que a gente quer, lendo, estudando, chegando ao nosso quase máximo. Isso incomoda muito. Mas não ser aceito dói muito.
Também professora, ela acredita que muitas falhas percebidas na sociedade estão relacionadas ao sistema educacional do país.
— O que eu fico pensando é o quanto a gente erra na sala de aula, porque essas pessoas não foram educadas para saber de onde vieram e quem elas são, de fato. Eu lamento muitíssimo, achei um episódio extremamente desagradável, mas não muito diferente do que acontece diariamente com milhares de pessoas neste país. Queria dar um abraço na Cacau, se eu pudesse, mas estamos no mesmo barco, esta é a verdade — afirmou.
Repercussão nacional — Diversos artistas também se solidarizaram com Cacau e se indignaram com o ocorrido.
O dançarino Carlinhos de Jesus postou: “Você está acima de tudo isso!! #Racismonão. Siga, estamos juntos sempre!
O ator Marcos Pasquim, que também participou da gravação, se manifestou do Instagram, se solidarizando com a colega. "Cacau Protásio é uma talentosa atriz com quase 20 anos de carreira. Mulher, negra, guerreira e que merece nosso respeito. Não há hipótese em que episódios de racismo possam ser tolerados. Racismo é crime, e ponto. A você, Cacau, toda a minha solidariedade", escreveu Pasquim.
Posicionamento oficial — O Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro se manifestou por meio de nota e também através do perfil no Instagram, comentando no perfil da atriz o mesmo conteúdo da nota.
"O Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ) informa que não compactua com qualquer ato discriminatório. A corporação se solidariza com a atriz Cacau Protásio e já abriu procedimento interno para identificar o(s) militar(es) e apurar a conduta. O CBMERJ reforça o seu compromisso com a população de Vida Alheia e Riquezas Salvar independente de cor, gênero, raça ou qualquer outra distinção. Os atos divulgados não representam a corporação centenária que, por anos seguidos, é considerada a instituição mais confiável do Brasil". 

Folha da Manhã

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