"Ajude-me a ir ao ‘The Voice Brasil’”. É improvável que alguém passe pelo Boulevard Francisco de Paula, no Centro de Campos, nas tardes de segunda a sexta-feira, e não note essa frase escrita em um pedaço de papelão. O cartaz improvisado fica ao lado de um jovem que, na correria do dia a dia, provavelmente não chamaria a atenção se não cantasse em alto e bom som, com uma bela voz. Trata-se do campista James Bruno Paulo, que, aos 24 anos, tem o popular Calçadão como seu local de trabalho, arrecadando doações para sobreviver e lutar pelo sonho de ser um cantor profissional.
— A minha relação com a música vem desde a infância — explica James: — Graças a Deus, cresci num berço evangélico. Mas, eu não cantava. Um dia, na igreja, montamos um coral de crianças para uma apresentação. Como o pessoal da igreja gostou muito dessa apresentação, continuamos com o coral. Até então, uma menina fazia a voz principal. Um dia, ela não pôde ir, e eu ganhei essa oportunidade. De lá para cá, venho investindo na minha voz e no dom que Deus me deu.
O episódio citado se passou quando James tinha apenas oito anos de idade. Aos quatro, já havia perdido a mãe, Mirian Paulo, que faleceu precocemente. Como sequer tinha conhecido o pai, pois este não viveu com a família, passou a ser criado pela avó materna, Nadir Paulo, assim como seu casal de irmãos. Outra perda familiar, desta vez da avó, fez com que a criação de James e dos irmãos ficasse sob responsabilidade da tia Maria de Fátima.
— Aos 13 anos, parei de ir ao coral, porque, infelizmente, a minha avó também faleceu, e eu fiquei um tempo sem ir à igreja — lamenta o agora adulto James, que cresceu no Parque Eldorado, em Guarus.
A dura realidade apresentou ao menino James a necessidade de trabalhar. Ainda adolescente, com 16 anos, começou a panfletar no Centro da cidade. A distribuição de anúncios impressos resultava em algum dinheiro para ajudar à tia em casa. Logo depois, passou a vender goiabas. Já no início da vida adulta, também tentando melhorar a situação financeira, se mudou para Guarulhos, em São Paulo, onde conseguiu trabalho num estabelecimento comercial. Àquela altura, já se relacionava com Bianca, sua esposa, e tinha com ela uma filha, Emilly, hoje com cinco anos.
— Apareceu uma oportunidade para eu trabalhar numa padaria, primeiro como balconista. Foi nessa padaria que pedi uma oportunidade para trabalhar como ajudante de padeiro, porque eu queria aprender uma profissão para levar mantimentos para casa e ajudar a minha tia, que cuidava de mim e do meu irmão — recorda o jovem.
A temporada em Guarulhos durou aproximadamente três anos, de 2019 a 2022. Ao retornar a Campos no ano passado, já com 22 anos, foi contratado como padeiro em uma padaria no Centro. Meses depois, passou para outra padaria, esta em Guarus, visando a trabalhar mais perto de casa. Lá permaneceu até há cerca de dois meses, quando resolveu deixar o emprego para levar a sério o sonho da infância.
— Em toda padaria que eu passava, todo mundo perguntava por que eu não investia no meu dom, na minha voz e no meu sonho. Conversando com a minha esposa, acabei acreditando um pouco mais em mim — comenta James. — Pedi as contas ao meu patrão porque queria investir na minha voz, queria trabalhar cantando no Calçadão. Ele compreendeu, porque antes eu já saía da padaria às 14h, tomava um banho em casa, pegava minhas coisas e ia trabalhar no Calçadão para ter uma renda extra. Algumas vezes, o meu patrão me viu ali. Então, ele já apoiava o meu trabalho e falou para eu acreditar mais em mim e no meu sonho — complementa.
Incentivo também não falta dentro de casa. Moradores do Conjunto Habitacional Novo Horizonte, no Jardim Aeroporto, James e Bianca tiveram uma segunda filha no ano passado. Ayla tem atualmente um ano e quatro meses. Dela e da irmã saem o maior estímulo para que o pai não deixe de acreditar. Seu atual objetivo é se inscrever no reality musical “The Voice Brasil”, da TV Globo, em 2024.
— O dinheiro do prêmio ajudaria muito a mim e à minha família. Além disso, seria uma oportunidade para eu mostrar um pouco da minha voz, contar a minha história, mostrar como eu comecei e homenagear a minha avó, que sempre me falou para continuar cantando. Ela via talento em mim. Quando ela faleceu, parei de ir à igreja, não queria mais cantar, porque foi uma dor imensa. Mas, quando minha tia pegou a minha guarda, ela lembrou isso e me falou para não desistir, porque minha avó sempre acreditou em mim — diz James, que cita como inspirações os cantores gospel Thalles Roberto e Anderson Freire.
Enquanto a divulgação nacional não chega, o campista segue emocionando e ganhando admiradores na cidade natal. Também divulga o seu talento na internet, publicando vídeos no perfil de Instagram @jamesbrunopauloo. Doações em forma de incentivo podem ser feitas via PIX, com a chave (22) 99619-1399.
— Através das pessoas, com Deus me abençoando todos os dias, eu consigo levar mantimentos para casa. Graças a Deus e às pessoas que me ajudam no Calçadão, Deus nunca deixou faltar. Hoje em dia, até minhas filhas me apoiam bastante, quase todo dia perguntam se vou cantar. Elas são minha motivação para nunca desistir — finaliza.
Folha 1