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quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

POLÍCIA MILITAR DO RIO TEM MAIS CHEFES DO QUE COMANDADOS

Com a promessa de assumir diretamente a responsabilidade pela segurança pública do Rio, o governador eleito Wilson Witzel (PSC) encampa, entre outros, o desafio de solucionar o colapso na organização hierárquica da Polícia Militar. Hoje, a corporação sofre o fenômeno da “pirâmide invertida”: conta com mais chefes do que comandados. Dados fornecidos pela PM mostram que, no quadro operacional, há 15.200 sargentos contra 11.894 cabos e 9.216 soldados. Já entre os oficiais, o número de majores supera o de capitães ou tenentes.
O cenário atual remonta a medida adotada pelo Estado desde a década de 80, com a criação de planos de carreira prevendo promoção pelo tempo de serviço, tanto para oficiais quanto para praças. Sem a necessidade de concursos internos, as ascensões de cargo levaram a improvisos operacionais e, segundo especialistas, interferiram diretamente na qualidade do policiamento. Por conta disso, é comum ver graduados serem escalados para funções subalternas, como dirigir uma viatura ou levantar a cancela na entrada de um quartel. Outro efeito provocado pela questão foi um rombo na previdência estadual, já que os salários cresceram mesmo sem, necessariamente, ocorrer mudança de tarefa.
Na tentativa de corrigir as distorções, a cúpula da corporação traçou uma proposta para frear as promoções pelo tempo de serviço. Na semana passada, dez deputados eleitos do Rio, entre estaduais e federais, foram recebidos pelo Estado Maior da PM para uma apresentação sobre o tema. O plano já havia sido exposto à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), em junho, e ao interventor federal, general Braga Netto, em agosto. Durante a corrida eleitoral, a sugestão foi levada aos candidatos a governo do estado, inclusive Witzel.
Promoções por decreto
No caso dos oficiais, a promoção de oficiais por tempo de serviço está balizada em leis estaduais — sancionadas em 1984, 2002 e 2011 —, e permite, por exemplo, que um tenente-coronel com 32 anos de serviço seja promovido automaticamente ao posto de coronel e passado imediatamente para a reserva remunerada, mesmo sem ter exercido o cargo.
Já o plano de carreira de praças foi editado por decretos. No ano eleitoral de 1996, o então governador Marcello Alencar (PSDB) possibilitou a promoção de soldados, cabos e sargentos da PM pelo tempo de serviço. Dessa forma, um soldado com dez anos de serviço se tornaria cabo e, cinco anos depois, era promovido a sargento sem a necessidade de concursos ou meritocracia. No ano seguinte, em novo decreto, foi alterada a obrigação de o PM ter uma ficha com classificação de comportamento “ótimo” e “excepcional”. Para ser promovido, bastava estar classificado como “bom”. Em 2012, nova mudança no decreto, na gestão Sérgio Cabral reduziu os intervalos de promoção: o primeiro, de dez para seis anos e o segundo, de 15 para 12 anos.
Atualmente, o déficit no número considerado ideal de soldados na PM é de 28.270.
A proposta estudada pela PM ataca diretamente a forma de promoção por tempo de serviço. Em relação aos praças que já estão na ativa, a ideia é manter o tempo já previsto, mas limitar a duas promoções por policial. No caso dos praças que irão entrar na corporação após a publicação do decreto, a proposta é limitar a duas promoções, sendo que a primeira acontece com 15 anos e a segunda, com 25 anos de serviço. Para a mudança de oficiais, o plano apresentado prevê que o oficial tenha 30 anos de serviço, incluindo cinco anos na última patente, para se aposentar com vencimento integral. “A gente imagina que tudo isso possa trazer ajustes no ingresso do número de integrantes da corporação, tanto para praças quanto para oficiais, permitindo ao longo dos anos que se tenha recursos humanos equilibrados para que, na hora em que se perder efetivo, isso já tenha sido calculado no passado” diz o coronel Renan Gomes de Oliveira, chefe do gabinete do Comando Geral da PM.
Para o Chefe do Estado Maior, coronel Henrique Pires, embora seja impopular a proposta de alteração na forma de promoção por tempo de serviço é a única saída para evitar uma futura crise. “É a opção que tem que ser feita. Temos que sair da nossa caixinha para entender a questão”, afirma.
A solução proposta pela cúpula da PM gerou insatisfação na tropa e criou resistências entre parlamentares. Na Alerj, deputados formaram uma frente parlamentar para barrar que a mudança ocorra via decreto. Presidente da Associação e Cabos e Soldados da PM, Vanderlei Ribeiro critica a iniciativa e afirma que a promoção por tempo de serviço não afeta o policiamento. “O fato de promover o homem por tempo de serviço não o tira da atividade. Muito pelo contrário, incentiva o camarada”.
Para a antropóloga Jacqueline Muniz, o abrandamento da forma de promoção por tempo de serviço não irá solucionar o problema. “O conserto para isso não virá como mudança na lei. É preciso mudar a mentalidade da corporação”. Na mesma linha segue a análise do antropólogo e ex-oficial do Bope Paulo Storani. Para ele, o foco da proposta está correto, mas a forma poderia ser outra. “É uma instituição que obedece aos padrões das Forças Armadas. É preciso criar uma metodologia para a PM”.
Segundo a assessoria de Wilson Witzel, o futuro governo prepara estudo para corrigir gradualmente as distorções do quadro de policiais militares. No início do próximo ano, será divulgada a data de convocação dos aprovados no concurso da PM.

Fonte: Extra

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