A Polícia Militar do Rio prepara uma licitação para terceirizar a produção de alimentos para os 44 mil agentes da corporação em todo o estado. Um estudo técnico preliminar para reavaliar a necessidade dos ranchos, feito a partir de recomendação do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), está sendo realizado pela corporação, que prevê iniciar a concorrência até agosto. Levantamento obtido pelo GLOBO revela que atualmente 724 militares, de diversas patentes, trabalham nos batalhões para preparar as refeições servidas aos policiais. Somente os salários desses agentes, custam mensalmente R$ 8 milhões aos cofres públicos.
Nos ranchos da polícia, hoje trabalham 20 oficiais, 242 segundos-sargentos, 148 primeiros-sargentos, 92 subtenentes, 82 terceiros-sargentos, 120 cabos e 20 soldados. A ideia é que uma empresa de alimentos assuma a operação da cozinha, preparando as refeições no local.
“O que se quer demonstrar é que há uma notória pressão pelo fim dos ranchos, inclusive com o encaminhamento de denúncias ao Ministério Público e na mídia quanto ao fornecimento de alimentação nas unidades. Cumpre elucidar que as denúncias são encaminhadas à SEPM, e a maioria delas é esclarecida de forma objetiva e plena, demonstrando-se que a alimentação e a hidratação adequadas são fornecidas de fato aos policiais militares de serviço. No entanto, tais fatos maculam a imagem da corporação, corroborando ser oportuno e conveniente demonstrar às autoridades competentes o levantamento médio dos custos associados à alimentação” diz trecho do documento obtido pelo GLOBO.
Custo: R$ 11 milhões/mês
As refeições são produzidas em 51 unidades espalhadas pelo estado. São disponibilizadas quatro refeições diárias: desjejum, almoço, jantar e ceia. Terceirizar a operação dos ranchos foi uma escolha feita após um estudo estimar o gasto com a contratação de empresas e comparar com o atual modelo de gestão (100% operados pela PM) e o pagamento de tíquete alimentação. Nos moldes atuais, os ranchos custam R$ 11,3 milhões ao mês à PM. Depois dos salários, a compra de alimentos é o maior gasto, com R$ 2,1 milhões. O restante são custos de materiais de limpeza, água, gás e utensílios.
O gasto estimado nas contratações de empresas que operariam os ranchos seria cerca de R$ 8 milhões, o que geraria uma economia de quase R$ 40 milhões por ano aos cofres públicos, além de o efetivo poder ser transferido para trabalhar nas ruas. O modelo de tíquete foi descartado por ser duas vezes mais caro e por alguns agentes não poderem deixar os batalhões.
Na última quarta-feira, a Polícia Militar realizou uma audiência pública onde apresentou às empresas de alimentos como o desenho do projeto está sendo feito. Os representantes dos bufês também apresentaram dúvidas sobre os futuros certames. No estudo, que ainda está sendo elaborado, e servirá de base para a licitação, a PM prevê que seja feito um pregão por batalhão. Uma empresa poderá se candidatar a mais de uma unidade. O contrato seria de 12 meses inicialmente. Essa seria também uma recomendação do TCE-RJ para aumentar a competitividade entre as empresas.
Nos últimos meses, a Empresa Pública de Obras do Rio (Emop) tem feito reformas em alguns ranchos do estado. Mas uma mudança estrutural que deve ocorrer na licitação seria a redução do número de ranchos operacionais. De 51 cozinhas, apenas 39 funcionariam, sendo que algumas unidades receberiam a comida via transporte. Para não realizar obras, a unidade receberia a alimentação preparada no batalhão vizinho. Seriam realizados apenas a modernização dos refeitórios para acomodar os policiais. Um exemplo seria o 23º BPM (Leblon), que recebia a alimentação do 19º BPM (Copacabana). Outro é o Centro de Fisiatria e Reabilitação da PM, que tem um número de militares menor que outras unidades.
Os alimentos seriam servidos em bufê self service. No almoço, por exemplo, seriam duas saladas, arroz integral e branco, duas proteínas (uma branca e outra vermelha), uma leguminosa (como feijão), uma guarnição quente e polpa de fruta ou mate. Outra discussão, que é feita dentro da polícia, é a possibilidade de as empresas venderem os alimentos para o público externo. No entanto, devido ao controle de acesso às unidades, ainda não se sabe como seria adotada a medida.
Pela dificuldade em separar os relógios de água e luz, a PM ficaria responsável pelo pagamento às concessionarias. Mas o gás seria de responsabilidade das empresas. O repasse direto às contratadas deve ser feito por refeição consumida. O controle seria por roleta eletrônica liberada com a matrícula do servidor.
“Pode-se inferir que a terceirização dos ranchos vislumbra-se como a modalidade mais viável tecnicamente para a SEPM, à qual não se dá apenas pelos critérios econômicos, mas pelas diversas características estratégicas que o serviço terceirizado oferece, como por exemplo, reduzir a complexidade relacionada à gestão de inúmeros contratos, controle sanitários exigidos pelas normas sanitárias, entre outros, possibilitando um serviço ininterrupto, integrado e eficaz”, diz outro trecho do estudo preliminar.
Outras iniciativas
Essa não foi a primeira tentativa de acabar com os ranchos na PM. Há cerca de dez anos, o então comandante da PM, coronel Ibis Silva Pereira, e o chefe do Estado-Maior da corporação à época, coronel Robson Rodrigues, defenderam a mudança para o tíquete alimentação. Em 2008, o então governador Sérgio Cabral também estudou a medida, após acabar com as antigas oficinas da polícia que funcionam nos batalhões.
— O rancho obedece a uma lógica militar que não se justifica mais na PM. O melhor seria mesmo garantir que cada PM recebesse um valor mensal para que se alimentasse externamente. A verdade é que fizemos uma pesquisa com os policiais na época dessa proposta e havia uma insatisfação geral com o serviço — diz Rodrigues, que hoje está na reserva e atua como antropólogo e pesquisador do Laboratório de Análise da Violência (LAV) da Uerj.
Segundo o coronel, a permanência do rancho se justifica apenas em unidades hospitalares e de ensino da corporação.
— Considero que a medida de acabar com o rancho é acertada e está atrasada, se estão pensando e levar adiante esse projeto, mesmo tardiamente, isso é muito bem-vindo — afirma.
Jornal Extra (Colaborou Carmélio Dias)
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