Começou com o Natal, companheiro da amiga Toinha, homem trabalhador, de poucas palavras sim, mas sempre pronto a ajudar os colegas na prefeitura da Bom Jesus do Norte, os amigos e os vizinhos.
Depois veio Aparecida. A querida Aparecida que conheci no Rio, em 1981, quando fiz amizade com seu filho na faculdade e fui, amavelmente, aceito em sua casa. Mãe, esposa e mulher de muita fé. Foi casada por 60 anos com o Faustino (de quem falarei mais adiante) e teve dois filhos muito queridos: Tino e Kiara.
Poucos dias depois foi o Paulo Sérgio, o Cyrillo, conhecido em toda a cidade não só pela política, mas por ser amigo dos amigos. Um homem muito gentil, idealista, de boa e inteligente conversa, e integrante de uma das famílias mais tradicionais da nossa Bom Jesus do Itabapoana.
Apenas três dias mais tarde, foi a vez de nossa querida Socorro. A Socorro amiga, apaziguadora e dedicada secretária do Gabinete na gestão Dr. Adson em Bom Jesus do Norte. Amiga da boa música, das artes e da língua espanhola. Ela lia e estudava com afinco o idioma de Cervantes, de Almodóvar e de Luís Miguel.
Na semana seguinte, foi o querido e tão amado esposo da Aparecida. Peço licença aos demais para fazer mais de um parágrafo para essa quinta estrela. Faustino Ruiz Fernández veio de Madri-Getafe já rapaz; amante do futebol, era sócio e torcedor fanático do Real, jogava bem e aqui se transformou no rápido ponta esquerda Espanhol, do Ordem e Progresso F.C. Conheceu e se apaixonou por Aparecida. Casaram-se e foram tentar a vida no Rio. Lá fez de tudo um pouco.
Quando era bancário e já pai de Tino Marcos teve que recusar um sonho: ser repórter esportivo de rádio. Ele sabia muito do futebol, lia tudo e comentava com propriedade. O forte sotaque não seria barreira, poderia até dar um toque internacional às transmissões. Mas entre a segurança e o sonho, ele ficou com a primeira.
Já ia me esquecendo, e não posso: aqui no Brasil ele escolheu o Flamengo. E se dedicou tanto ao time da Gávea quanto ao seu querido Madrid (assim chamam o clube os torcedores locais). Ia a todos os jogos, inclusive quando o campeonato deixou de ser carioca; ele pegava seu carro e partia para o interior. Tudo em nome da paixão, que passou para o primogênito.
Seguindo a tradição moveleira da família, abriu uma fábrica de móveis, batizada de Matisse (era um apaixonado pelas artes plásticas também). Depois chegou a Kiara, filha muito amada e caçulinha temporã. Conheci essa família tão querida e harmoniosa no tempo em que o hobby de Faustino era montar “rompe-cabezas” (como se diz quebra-cabeças em espanhol), mas daqueles de mil e não sei quantas peças, verdadeiros desafios que, prontos, viravam obras dignas de moldura.
Falando em quadros, Faustino, o Tino para os familiares, pintava sim, e muito bem. Tinha técnica, disciplina e inspiração. Foi seguindo a vida até que o filho se formou e realizou, em dobro, triplo ou mais, o sonho dele: se tornou o melhor repórter esportivo da TV brasileira. Tino Marcos, o Tininho pra nós, cobriu a seleção brasileira durante 30 anos, foi a todas as Copas entre 1990 e 2018.
Tino, o filho, encheu o pai de orgulho, ao cobrir dois títulos do Brasil, mas, principalmente, o único de sua querida Espanha (La Roja). Também no futebol ele contava a grande alegria de ter conhecido seus três maiores ídolos pessoalmente: Alfredo Di Stéfano, Raul “Madrid” e Zico, o Galinho de seu Mengo.
Um dia resolveu se aposentar, passou a fábrica e voltou ao interior, onde conhecera sua Aparecida. Kiara veio junto e ingressou na carreira pública. Faustino, que nunca foi contra novas tecnologias e não precisava de óculos para ler, mesmo com mais de 80, aprendeu a baixar filmes da internet.
Fazia isso com uma dedicação que me dava inveja: escolhia os melhores títulos, clássicos, baixava-os, buscava as legendas em português, passava o suprassumo para DVD e confeccionava as capas para as caixinhas. Tudo devidamente catalogado, uma filmoteca maravilhosa, das melhores, senão a melhor da região.
Depois, como um grande leitor que era, aprendeu a ler no Kindle. E vivia com o leitor na mão, sempre devorando os melhores títulos e dominando a máquina. Outra paixão de “seu” Tino eram as caminhadas. Ele andava a cidade toda, ia a bancos, ao comércio, conversava com todos, participava de programas de rádio (aí teve o gostinho de falar de futebol no meio que mais gostava), e sempre, mas sempre mesmo, tinha uma piada ou um trocadilho novo.
Quem teve o privilégio de conviver com esse querido nunca se esquece de suas histórias, como a que causou espanto, mas depois muitos risos, quando soltou uma das suas numa mesa de sisudos empresários paulistanos. Tem também aquela de que ele se colocou “à disposição” da moça que “esbarrou” nele numa rua do centro carioca.
Nos últimos tempos ele não podia mais caminhar, mas não se abateu, manteve a cabeça ativa, ligado em tudo, bem informado e não esquecendo das lindas histórias que viveu. Apesar de declarar que ainda queria viver, cultivando a memória de sua Aparecida, talvez a saudade o tenha vencido. Nos deixou órfãos nesse mundinho de meu Deus pouco depois da partida de sua Amada.
Mas como eu creio que Deus é muito bom, Ele vai permitir que eles sejam as estrelinhas mais próximas dessas cinco que já brilham intensamente no Céu. Desculpem se me alonguei, mas precisava dizer isso tudo. Ficamos aqui, seguindo a vida, mas a saudade vai doer bastante ainda antes de virar só nostalgia e amor.
Yelmo Papa
Bom Jesus, 23 de novembro de 2020
Blog do Jailton da Penha
Parabéns...que lindo a forma de homenagear essas estrelas.
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