“Enterro de sambista não tem chororô. Enterro de malandro é alegria, é lembrar as boas conversas, tomar uma cerveja”. A frase é do famoso cantor e compositor Zeca Pagodinho. Foi dita durante o velório do intérprete de samba de enredo da Mangueira, Jamelão, que não suportava ser chamado de puxador de samba. “Puxador é ladrão de carros”, dizia Jamelão, quando estava de bom humor. No mau humor, sai de baixo. O repórter, por exemplo, ouviria os maiores impropérios possíveis.
Isso é verdade. Toda vez que morre um sambista, pagodeiro, elemento do Partido Alto ou malandro, que gosta de farra, bebida e não deixa ninguém em apuros, há uma pequena festa, regada pela saudade, muita bebida e música; como se fosse uma roda de samba para homenagear o falecido.
Isso valeu para o velório de um boêmio da Capital Secreta; Gleison Silva, de 68 anos, conhecido com ‘Gleison da Ilha’. Flamenguista roxo e figura conhecida da cidade de Cachoeiro de Itapemirim, ‘seu Gleison da Ilha’ pediu, durante toda sua vida, que seu velório fosse em ritmo de samba, pinga e cerveja. O pedido foi reafirmado na última quarta-feira (10), quando estava em um leito de hospital, em razão de um Acidente Vascular Cerebral (AVC) sofrido na terça-feira (9).
Na quinta, o cachoeirense não resistiu e partiu para agitar uma roda de samba lá no céu. O velório começou por volta de 12h da sexta-feira (12). Por volta das 23h, amigos e familiares se juntaram em uma roda de samba em clima saudoso, para festejar seus dias vividos na terra. O samba cortou madrugada adentro no bar, no qual por mais de 20 anos esteve à frente, onde hoje, o filho Gláucio, conhecido como ‘Batata’, ‘toca o barco’.
Fundador da escola de samba Explosão do Novo Parque, o falecido foi homenageado. Em seu caixão, coberto por suas duas paixões, a bandeira do seu amado clube e o pavilhão de sua escola de samba: Explosão do Novo Parque.
“Se tivesse que escolher outro, escolheria ele. Ótimo pai, excelente marido e avô. Um homem maravilhoso que já pisou nessa terra. Animado, festeiro, sambista de carteirinha e diferente, esse era o meu pai. Vai fazer muita falta”, disse um dos filhos, Glaúcio.
E como todo samba precisa sempre de uma boa companhia, vale lembrar que o falecido não foi o único neste batuque. Antes dele, em atitudes semelhantes, o conhecidíssimo boêmio e bom de copo ‘Baleia’ (Sebastião Mauricio dos Santos) também inovou no seu velório pedindo aos familiares que em vez de choro e ambiente sombrio, calado, de luto, celebrassem a sua partida de maneira festiva. No ano passado ‘Baleia’ faleceu e seus familiares fizeram uma partida regada à música e à cerveja, como fora pedido seu. Outro fato semelhante aconteceu no velório de outro cachoeirense, Antonio Domingues, conhecido como ‘Marinheiro’. Ao ser sepultado no Cemitério Parque no bairro IBC, familiares também se despediram com festa e com Brahma Chopp. Gostava tanto de viver que na sua lápide está escrito “viver e não ter a vergonha de ser feliz”.
Como dizem os versos de Noel Rosa, “não quero flores nem coroa com espinho. Só quero choro de flauta, violão e cavaquinho... Não quero choro nem vela. Quero uma fita amarela, gravada com nome dela”. Descanse em paz, Gleison. E visite as rodas de samba que devem existir por aí. Se não existirem, não pode ser chamado de Paraíso.
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