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terça-feira, 23 de junho de 2020

FIM DE UMA ÉPOCA: PRAIA DE MEAÍPE, NO LITORAL CAPIXABA, VAI SE DESPEDINDO

O fim de uma época
Mar avança sobre a bela faixa de areia que marcou gerações
Enquanto o mundo insiste nos debates inócuos e discussões estéreis sobre como preservar o meio ambiente – sem, contudo, realizar nada de efetivo e concreto – o aquecimento global vai se tornando uma realidade cada vez mais presente, acarretando, entre outras consequências, o aumento do nível do mar, com reflexo direto na erosão costeira.
Assim tem sido no Brasil e em áreas litorâneas de diferentes partes do mundo – vítimas dos desastres climáticos que se intensificam ante a ação predatória do homem.
O texto, aparentemente pouco apropriado ao momento de pandemia, tem seu motivo de ser. De certo, as mudanças extremas no clima – ora com longos períodos de estiagem, ora com incessantes temporais – trazem distúrbio de tal ordem que se equiparam a uma pandemia sistêmica – ininterrupta e que a todos afeta.
Distante 190 quilômetros de Campos, a praia de Meaípe – uma das mais belas do litoral capixaba – está desaparecendo. A lamentável constatação diz respeito também ao campista, cuja boa fatia dos veranistas tem por costume passar verões e feriados prolongados em Guarapari e, por extensão, também em Meaípe, visto que apenas 8 quilômetros, ou 5 minutos de carro, separam ambas.
O que agora, em meados de 2020, se confirma, afasta a hipótese de que os avanços do mar, observados no ano passado, tenham sido eventos isolados. Ao contrário, o desaparecimento da faixa de areia se consolida, sendo que as imagens aqui reproduzidas, tiradas em março, se mantêm inalteradas.
Tristeza – Como praia propriamente dita, quase não existe mais. Foi-se o espaço que marcou as férias e os momentos de lazer de várias gerações. Da praia em curva, belíssimo visual de enseada que se podia ver de uma ponta à outra – bem como a Igreja de Santana, bem ao ‘fundo’, no alto – só ficaram lembrança e saudade. Uma tristeza só!
As enormes amendoeiras, que davam sombra natural aos banhistas, também se foram. Hoje pertence às fotos e à memória a praia sem ondas, em que as marolas se desfaziam bem antes de chegar à faixa repleta de barracas, onde famílias inteiras, gente de todas as idades, contemplava a beleza do lugar. Esse quadro, agora, é passado.
Os bolinhos – Já não existe o vaivém incessante dos que se exercitavam em caminhadas, bem como o som característico dos vendedores de picolé, de espetinho de camarão, de salgadinho e das tradicionais cocadas.
Não se pode esquecer os famosos bolinhos de aipim, camarão e carne, classificados como ‘Patrimônio Cultural Brasileiro’, fritados ‘ali em cima’, nos quiosques à beira-mar. Quem frequentou, não esquece do bolinho da ‘Tia Júlia’, que de ‘bolinho’ só tinha o nome – era enorme.
Praia que marcou gerações é referência desde os anos 70
A destruição costeira é um evento do qual o litoral do Espírito Santo não escapou. Nos anos 80 e 90, a praia de Marataízes desapareceu. Foi preciso um ‘quebra-mar’ para impedir que as ondas invadissem todo o lugar. Mas a praia em si virou um extenso areal que projeta o mar para longe. Não é a mesma coisa. O mesmo fenômeno vem alcançando outras praias do ES, como Piúma, por exemplo.
Meaípe, entretanto, em virtude da proximidade com Guarapari – praia mais conhecida do estado – pela beleza natural, estrutura hoteleira e a fama das moquecas servidas por seus restaurantes, passou a ganhar destaque a partir dos anos 70/80 e virou referência.
Marco em hotelaria – Há cerca de 50 anos era inaugurado o Hotel Gaeta – um dos maiores de toda região, só rivalizando, então, com o Coronado, em Guarapari e, mais tarde, com o Espadarte, em Iriri.
De frente para a praia, com seus cinco andares de apartamentos amplos e com varanda, o Gaeta impulsionou o turismo em Meaípe. Piscinas, área de lazer, parquinho, sauna, salão restaurante, confortável sala de estar, elevador que chegava à garagem e um grande varandão na entrada, alto e imponente, – o hotel trouxe conforto e sofisticação à praia.
Há cerca de 10 anos, infelizmente – portanto, sem nada a ver com o avanço do mar – o Gaeta fechou para manutenção e reparos. Por algum motivo, as obras foram paralisadas e o hotel mais charmoso da praia continua fechado.
Moquecas – Paralelamente – também há mais de 50 anos – começava a fazer sucesso o Restaurante Gaeta, e não tardaria em ficar famoso por servir uma das melhores moquecas do Brasil, com repetidos prêmios no Guia 4 rodas.
Não menos conhecido, logo chegou o ‘Cantinho do Curuca’, com seu enorme salão – o maior daquela região – igualmente várias vezes premiado pelas deliciosas moquecas de peixe, camarão e lagosta.
Bom que se diga, outros restaurantes também fazem parte do circuito gastronômico de Meaípe, todos de altíssima qualidade. Afinal, como costumam dizer, ‘moqueca é capixaba; o resto é peixada’.
Com o prestígio em alta, impulsionado pela beleza das águas mansas, pela gastronomia, bares e casas noturnas como ‘Tribo de Gaia’, Meaípe ganharia a Boate ‘mais’ – que durante longos anos foi a mais famosa de todo o litoral do ES, com shows que atraíam frequentadores assíduos desde Vitória até Cachoeiro – sem falar de estados vizinhos.
Boa infraestrutura felizmente se mantém
A orla de Meaípe vem sendo reparada, com obras que ficaram ainda mais atrasadas por causa da pandemia. De toda sorte, não existe mais a faixa de areia. A praia, ao que tudo indica, não retornará, senão por vontade da natureza.
Por outro lado, a sobrevivência dos restaurantes, face à fama que conquistaram, não depende do banhista. As pessoas frequentam pela longa tradição de boa comida.
Já os hotéis, alguns de excelente nível, apesar da falta de banhistas, possivelmente se manterão, beneficiados, também, pela pouca distância de Guarapari.

Jornal Terceira Via

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