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segunda-feira, 16 de outubro de 2017

MAPA DO CRACK MOSTRA CONSUMO ALTO DA DROGA NO INTERIOR DO ES

Levantamento foi feito pela Confederação Nacional dos Municípios
A triste, e muitas vezes chocante, imagem de usuários dependentes do crack já não é mais uma exclusividade dos centros urbanos. O problema de saúde pública vem disseminando suas graves consequências à medida que também avança para as zonas rurais.
A nova preocupação é revelada pelo Mapa do Crack, elaborado pelo Observatório do Crack, da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Das 78 cidades do Espírito Santo, 18 delas - todas no interior, de Norte à Sul - consideram alto o número de problemas ligados ao uso da cocaína adaptada para ser fumada. São eles: Boa Esperança, Pinheiros, Jaguaré, Sooretama, São Mateus, Pancas, Água Doce do Norte, Baixo Guandu, Aracruz, Santa Maria de Jetibá, Ibitirama, Divino São Lourenço, Caparaó, Castelo, Cachoeiro de Itapemirim, Vargem Alta, Muqui, Mimoso do Sul, Bom Jesus do Norte e Marataízes.
Conforme explica o consultor da CNM, Eduardo Stranz, o estudo geográfico toma por base as respostas dos próprios gestores municipais, que classificam o problema como alto, médio ou baixo, de acordo com o nível de sua interferência nas áreas de assistência, educação, saúde e segurança.
Trinta e duas cidades (a exemplo de Vitória, Cariacica, Vila Velha e Viana) declararam ter um nível médio de problemas, enquanto outras 16 afirmam ter um nível baixo e 11 não responderam à CNM. Apenas Dores do Rio Preto diz não enfrentar nenhuma dificuldade. O Jornal A GAZETA entrou em contato com as 78 prefeituras para saber o que cada uma está fazendo em relação ao tema. O raio X completo você confere na próxima página.
Epidemia
O momento de expansão do uso e dos danos do crack é observado em todo o Brasil, ressalta Eduardo. “O mercado vai aonde está o consumidor. Uma série de fatores contribui para isso, como a rapidez da comunicação e a migração de pessoas, especialmente dos jovens. Muitos vão trabalhar no campo e levam as drogas”, analisa.
Para além da oferta, o psiquiatra e membro da Comissão de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Valdir Ribeiro Campos, destaca que o baixo valor da droga também instiga o consumo e faz com que a dependência do crack alcance dimensões de uma epidemia cada vez maior. “No interior, a dificuldade de emprego muitas vezes é grande. Por isso, alguns usuários tornam-se pequenos traficantes. Isso potencializa a distribuição”, diz.
Na visão de especialistas, o problema pode ir além do que aparece no mapa. Coordenador do Estado sobre drogas e responsável pela execução do Programa de Valorização à Vida (Pro-vive), Gilson Giuberti Filho, acredita que mesmo municípios que declararam índices baixos e médios podem ter problemas maiores. Entre eles, estão Colatina e Linhares.
“Sabemos que, depois da Grande Vitória, essas são as duas cidades que mais judicializam pedidos de internação. Em Pedro Canário, que não forneceu resposta, também sabemos que o problema é grande”, justifica. Gilson acrescenta que parte das cidades que relatam altos índices localizam-se justamente em regiões onde há pouca assistência.
“Existe sim um vazio assistencial no Estado, exatamente onde encontramos alguns municípios de alto e médio uso de crack, como Montanha, Pinheiros, Boa Esperança, Nova Venécia, Conceição da Barra. Essa é a região que tem menos equipamentos de saúde e de assistência, como equipes e ambulatórios. No Sul do estado a mesma coisa, nos municípios ao redor de Cachoeiro. Também é comum encontrarmos o problema em cidades de fronteira, como Baixo Guandu e Pancas, pois são locais preferidos pelos traficantes”, afirma.
“Acredito que o problema é geral. É difícil haver locais próximos com dados tão distintos. Pode ser que outros municípios tenham o problema e não conseguiram vê-lo ou fecharam os olhos”, diz o psiquiatra e professor da UVV, Valber Dias Pinto.
Apesar de as metrópoles ainda serem mais afetadas pelo crack, o professor do mestrado em Segurança Pública da Universidade de Vila Velha (UVV), Pablo Lira, ressalta que a chegada de drogas às zonas rurais e aos municípios polos nas últimas décadas tem como reflexo, inclusive, o aumento das taxas de homicídio.
“Estudos, como o próprio Mapa da Violência, têm mostrado isso. Nessas áreas, os problemas sociais e econômicos influenciam o consumo e o tráfico de drogas ilícitas”, pontua o professor.
Pablo explica que a associação entre o consumo de drogas e a violência se dá por três vertentes: “A primeira são as alterações psicofarmacológicas do indivíduo tanto no período em que ele faz uso da substância, quanto durante a abstinência; a segunda é a compulsão pela droga, que o faz cometer desde pequenos furtos até o latrocínio, e por último, é o trafico de drogas ilícitas, que também está ligado à violência armada”, diz Pablo.
Danos
Segundo Pablo, um estudo de nível internacional realizado em 2007, aponta a cocaína, tanto em pó, quanto em pedra (que dá origem ao crack), como a segunda droga com maior potencial de dependência e de danos físicos no mundo, perdendo apenas para a heroína.
Nas grandes cidades, o consumo da droga é influenciado pelo adensamento populacional, falta de infraestrutura urbana e por problemas de ordem socioeconômica, como o desemprego. Mas engana-se quem pensa que o uso abusivo da droga ilícita se restringe apenas aos mais pobres.
“Nas últimas pesquisas, vemos um aumento do número de famílias de classe média e alta consumindo crack”, aponta Pablo.
Para o professor, apesar de basear-se apenas na autodeclaração dos municípios, o mapa do Observatório do Crack representa uma tentativa de reunir dados acerca do assunto.
“No Brasil temos uma grande dificuldade de reunir uma base de dados que embasem as políticas públicas. Em países como Estados Unidos isso é uma realidade”, critica.
Ação no sistema nervoso
Com uma intensa ação no sistema nervoso, o crack não só gera dependência rapidamente, como também causa sérios danos físicos aos usuários, tornando a assistência na área de saúde e social fundamental. Mas, em muitos locais, principalmente no interior, ela ainda chega de forma precária.
De acordo com Valdir Ribeiro Campos, da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), devido ao baixo número de habitantes, esses locais não possuem Centros de Atenção Psicossocial (Caps). “O auxílio acaba sendo prestado basicamente pelas unidades de saúde”, acrescenta. No caso do Espírito Santo, muitas prefeituras alegam não possuir programas específicos de combate às drogas e alguns trabalhos ficam restritos aos Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e aos Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), quando eles existem.
O psiquiatra e professor da UVV, Valber Dias Pinto, destaca ainda a falta de leitos em hospitais, destinados à saúde mental. “Houve uma redução nos últimos anos. O dinheiro da Saúde Mental foi mal utilizado. Essa falta leva a números cada vez maiores de judicialização dos casos para internação”.
Internação
Para conseguir uma internação, dependentes químicos de todo o Estado precisam vir à Capital para serem examinados e encaminhados às unidades terapêuticas através do Programa de Valorização à Vida (Pro-vive). No entanto, a criação de uma plataforma digital promete interligar os Centros de Atenção Psicossocial dos municípios (Caps) e agilizar esse processo.
Conforme explica o coordenador estadual sobre drogas, Gilson Giuberti Filho, a meta inicial é instalar o Pro-vive Virtual em Nova Venécia e São Mateus. A primeira reunião do projeto acontecerá no dia 25 deste mês. Em seguida, a ideia será levada a Colatina e Linhares.
“Com a ferramenta, as equipes de outras regiões podem pedir assessoria para nós através de vídeo-conferências. As solicitações serão enviadas e o paciente já sairá do Caps para unidades terapêuticas. Isso agilizará muito os atendimentos”, diz.
Segundo Gilson, uma parceria com a Defensoria Pública Estadual também tem contribuído para a redução do número de famílias que solicitam internações através da Justiça. " Com o acordo de cooperação, o paciente procura a Defensoria e ela o encaminha até nós, que tentamos o diálogo. Em 50% dos casos, conseguimos reverter a situação em um tratamento voluntário, seja numa unidade terapêutica ou ambulatorial. Isso resulta em menos gastos para o Estado", detalha.
O COMBATE ÀS DROGAS
Com o objetivo de conhecer as ações e os programas desenvolvidos para o combate ao uso de drogas, em especial do crack, o Jornal A GAZETA foi em busca de respostas em todas as 78 prefeituras, de Norte à Sul do Estado. O resultado deste Raio-X, o leitor confere logo abaixo. Ao lado é possível ver também uma reprodução do Mapa do Crack, fornecido pelo Observatório do Crack.
- Alegre
Possui Caps para atender usuários e familiares. Há projeto de prevenção em escolas em parceria com cursos de Psicologia.
- Apiacá
Não há programa de combate às drogas. A prevenção é feita por ações de incentivo ao esporte.
- Bom Jesus do Norte
Não há programa de combate. A prefeitura aderiu ao Programa Saúde na Escola (PSE), do governo federal, que propõe a conscientização sobre as drogas, além de outras atividades.
- Guaçuí
A equipe multidisciplinar do Caps atende os dependentes. Não há serviço de internação na cidade. No Caps, os danos físicos também são tratados. O local possui uma farmácia.
- Mimoso do Sul
Além do Caps, a cidade conta a Casa Reviver, que tem feito um trabalho com dependentes de álcool e outras drogas. A prefeitura auxilia através dos profissionais que atendem na clínica e do repasse de recursos.
- Presidente Kennedy
O Programa Educacional de Resistência às Drogras - Proerd, da PM, já formou 738 alunos. Já o Programa Sentinela será implantado como forma de apoio às ações de combate às drogas e entra em funcionamento até o ano que vem.
- São José do Calçado
Possui um Caps. Duas vezes ao mês há palestras com depoimentos de ex-usuários. Caso o paciente procure atendimento psicológico e acompanhamento com o grupo de auto-ajuda ou queira a internação, são feitos estudos e acompanhamentos.

fonte: Gazeta Online

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