RIO — Enquanto o processo contra os três deputados estaduais presos na Operação Cadeia Velha está prestes a entrar em julgamento, o Ministério Público Federal (MPF) se debruça sobre uma nova frente de investigações envolvendo parlamentares: as nomeações feitas em troca de apoio ao grupo político no poder — o famoso toma lá dá cá .
No computador do ex-líder de governo Edson Albertassi (MDB), preso desde novembro de 2017, a Polícia Federal apreendeu o controle do aparelhamento de parte da máquina pública nos últimos anos. A planilha registra 3.309 indicações feitas por 88 políticos e servidores.
A grande maioria delas foi feita por 50 deputados estaduais e suplentes da última legislatura, sete prefeitos e ex-prefeitos, além de quatro deputados federais. Também há menções a codinomes como “Palácio” e “chefe”. A contabilidade vai até julho de 2016, segundo a PF.
Eventualmente, Albertassi registrava a insistência dos políticos por um naco do poder. Em alguns casos, os políticos reiteravam várias vezes a recomendação de um apadrinhado para o mesmo cargo. Em outros, pediam promoções. É possível saber disso porque, de tão detalhada, a planilha traz o nome do indicado, o político que pediu o emprego, os órgãos e postos de trabalho almejados, além das datas de recebimento dos pleitos. No caso do Detran, a maioria das indicações eram para a função de vistoriador.
O documento lista os nomes de 2.409 pessoas que foram relacionadas pelos parlamentares para trabalhar em quase 30 órgãos públicos, incluindo o Detran e até mesmo empresas terceirizadas, o que chamou a atenção dos procuradores. Há casos de indicações de uma mesma pessoa para mais de uma vaga.
RAIO-X DO LOTEAMENTO POLÍTICO
Planilha apreendida na casa do deputado Edson Albertassi, hoje preso, mostra detalhes das indicações de cargos feitas por políticos na administração estadual e terceirizadas do estado. Veja abaixo os 20 políticos com mais indicações, segundo o documento.
Indicativo de corrupção
Para o MPF, as nomeações são um indicativo de corrupção. A maioria delas são feitas para cargos na área de atuação dos deputados, constituindo o que os procuradores tratam como feudos eleitorais.
— A ocupação de cargos é uma vantagem indevida para que aquele político atenda aos interesses do governo — ressalta o procurador Carlos Aguiar, coordenador da Lava-Jato do Rio na segunda instância.
Segundo Aguiar, os cargos descritos na planilha apontam que as indicações extrapolam as chamadas funções de confiança. A planilha cita casos de condenados até mesmo por homicídio qualificado indicados por parlamentares.
Em relatório, a PF diz que “a constatação de que as empresas de prestação de serviço terceirizado ao DETRAN/RJ estão ‘subordinadas’ a esses políticos demonstram a utilização da máquina pública para atender interesses espúrios”. Afirma também que “o esquema pode resultar, ainda, na arrecadação de propina”.
Durante as buscas da Operação Cadeia Velha, foi apreendido outro documento com o mesmo propósito, atribuído a Paulo Melo, ex-presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), também preso na operação. O terceiro preso na ação foi Jorge Picciani, que, à época, comandava a Casa. Enquanto a planilha de Albertassi é maior — tem mais de 40 páginas — e mais detalhada, a listagem do ex-presidente da Alerj tem 16 folhas e menos campos de organização. A planilha de Paulo Melo foi atualizada até agosto de 2017.
Desde a prisão dos três deputados, a Alerj tem sido alvo frequente de investigações . Um ano depois da prisão de Picciani, Paulo Melo e Albertassi, foram presos outros sete deputados estaduais na Operação Furna da Onça. Em dezembro, eles foram denunciados, e uma das provas utilizadas pelo MPF foi justamente a tabela de Albertassi.
Relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras obtidos na operação Furna da Onça apontaram ainda movimentações atípicas de 75 servidores e ex-servidores da Alerj. Em alguns casos, a suspeita é de que houve a chamada “rachadinha”, quando funcionários devolvem parte do salário para os parlamentares, além da contratação de comissionados fantasmas.
O que dizem os citados
A defesa de Edson Albertassi diz desconhecer a planilha e afirma que o ex-deputado “nunca inseriu nome de qualquer pessoa ou determinou que alguém o fizesse”. Renato Cozzolino, André Ceciliano, André Lazaroni e Marcos Muller afirmam que também desconhecem a planilha e negam ter feito indicações para Albertassi.
Ana Paula Rechuan diz que nunca tratou de indicações com o líder do governo, mas não vê problema em nomeações “de pessoas capacitadas”. Bebeto alega que as citações a seu nome são mentira. “Um outro deputado do meu partido pediu indicações e eu repassei currículos”.
A defesa de Marcos Abrahão admite que ele tinha por hábito encaminhar currículos, mas afirma que “essas indicações não tem qualquer relação com pagamento de vantagens indevidas ”. Dica reconhece que recebia currículos, mas nega ter influenciado órgãos ou empresas para beneficiar os indicados. Ele “só reconhece da lista citada, três nomes, nenhum deles parentes”.
Pedro Fernandes afirmou que “não existia relação de subserviência” com o governo. A defesa de Paulo Melo afirmou “não se tratar de loteamento de cargos, mas de participação no governo”. Já Zaqueu Teixeira declarou: “ o fato de ter indicado pessoas para trabalhar em terceirizadas nunca influenciou em minhas decisões”.
Márcio Pacheco disse que seu nome “foi usado de forma criminosa”. Luiz Martins, Chiquinho da Mangueira, Dr, Deodalto e Janio Mendes não responderam. A reportagem não conseguiu contato com Daniele Geurreiro, Rafael do Gordo e Zito.
Fonte: O Globo
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