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segunda-feira, 5 de setembro de 2016

MATÉRIA DO JORNAL "O GLOBO" RETRATA O CHOQUE CULTURAL DE PROFESSOR DO IFF DE BOM JESUS DO ITABAPOANA

FOTO: DIVULGAÇÃO IFF BOM JESUS
CHOQUE CULTURAL
Em 2015, Daniel Coelho voltou da Finlândia disposto a aplicar em suas aulas no Instituto Federal Fluminense, no campus de Bom Jesus do Itabapoana (RJ), muito do que tinha aprendido durante os cinco meses em que participou de um programa de capacitação para docentes na Universidade de Ciência Aplicada de Tampere. Ele fora um dos 60 brasileiros selecionados em 2014 para participar do programa do MEC e do CNPq “Professores para o Futuro”, que buscava trazer para os institutos federais tecnológicos brasileiros inovações na forma de ensinar inspiradas nas práticas de instituições finlandesas.

Daniel conta que a maior diferença que percebeu entre as aulas com as quais estamos acostumados no Brasil e as que vivenciou na Finlândia foi a metodologia muito mais participativa, em contraste com o formato de aulas tradicionais brasileiras, em que o estudante praticamente se limita a escutar o professor falar. Também chamou sua atenção o fato de lá a formação docente ter forte ênfase na aplicação da teoria na prática. “Aqui no Brasil, sempre me incomodou isso de chamar alguém para fazer palestra de autoajuda durante a semana pedagógica. Eles lá não ficam só teorizando. A teoria é importante, mas é muito mais aplicada à prática”.
A experiência na Finlândia _que Daniel compartilhou em palestra que fez no mês passado na Casa da Finlândia durante as Olímpiadas_ fez com que ele modificasse o formato de suas aulas. Mas ao aplicar o que aprendeu por lá aqui no Brasil, ele percebeu que a mudança não seria tão simples. Para incentivar este formato mais participativo, Daniel conta que as salas de aula finlandesas são muito mais agradáveis e confortáveis, até mesmo com sofás, para que o aluno se sinta como se estivesse em casa. Ele propôs então em seu instituto criar uma sala para projetos com mobiliário diferente. “Ouvi como resposta que a compra de móveis é unificada na reitoria e padronizada para todos os campi. Ainda há aqui uma cultura organizacional que te prende muito”.
A resistência à inovação não acontece apenas por causa da burocracia. Às vezes, parte do próprio aluno. “Já ouvi aluno perguntar se eu não ia dar aula quando propus uma atividade em que eles iam ser protagonistas. Às vezes dá vontade de escrever uma lição no quadro e fingir que estou ensinado para ficarem copiando. Mas não culpo os estudantes. Dar autonomia a quem nunca foi acostumado a ter é mesmo difícil”.
Apesar dessas dificuldades, ele não desistiu. “Mudei muito o formato de minhas aulas. Procuro fazer com que o aluno seja coparticipante. Não me preocupo tanto com a nota numa prova, mas com habilidades e atitudes. Passei a valorizar mais aquele aluno dedicado, interessado, que corre atrás dos desafios. Levo muito mais isso em conta na avaliação. Dou autonomia, mas cobro prazos e planejamento. A vida é baseada na resolução de problemas, e quero que eles aprendam dessa maneira”.
Daniel diz que, apesar da resistência de alguns, também recebe elogios de outros alunos, o que indica que é possível inovar. Mas essas mudanças não acontecem da noite para o dia. “A Finlândia investiu muito em capacitação profissional e reformulação de currículo. Há toda uma mudança de cultura que é necessária no Brasil. Não adianta querer começar de cima para baixo”.

O GLOBO/POR ANTÔNIO GOIS

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